José Perea Martins - Sim (risos). Minha vida profissional teve início como office boy de alfaiataria, aos 13 anos de idade. Comecei a aprender o ofício e, aos 15 anos, eu já ganhava igual a um profissional experiente. Depois, fiz um curso de telegrafia do código morse para trabalhar na Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. Eu fiquei muito feliz com o novo trabalho, mas a modernidade chegou e transformou o sistema de telegrafia em telefonia. Fomos dispensados (risos). Mas eu prestei um concurso na prefeitura, passei e trabalhei por mais de 30 anos no órgão público.
JC - Quais foram as suas atribuições na Prefeitura de Bauru?
José Perea - Comecei como fiscal, fui chefe de gabinete do então prefeito Irineu Bastos, oficial de gabinete do Nuno de Assis, assessor do Alcides Franciscato, secretário do Serviço de Previdência dos Municipiários (Seprem), que hoje é Fundação de Previdência dos Servidores Municipais de Bauru (Funprev), fui diretor do Departamento Pessoal e procurador jurídico, quando me aposentei. Quando saí da prefeitura eu comecei a advogar.
JC - Nesse meio tempo o senhor cursou Direito?
José Perea - Sim. Estudava de manhã e fazia faculdade à noite, na Instituição Toledo de Ensino (ITE). Cheguei a ter um escritório. Hoje dou conselhos e presto serviço sem cobrar, para amigos, principalmente em direito de família, que é uma área que eu gosto muito. Além da faculdade de Direito, estudei contabilidade. E, nas horas vagas, ainda tive outros ofícios.
JC - Quais foram estes outros trabalhos?
José Perea - Eu era guia de turismo. Gostei tanto do trabalho que montei uma agência e passei a me dedicar mais ao turismo. Depois eu cansei e montei um salão de eventos, o Greenville, na avenida José Henrique Ferraz, onde hoje é uma igreja.
JC - Quando surgiu o interesse pela língua portuguesa?
José Perea - Fui professor de português por ordem do MEC (Ministério da Educação) sem ser professor, quando fui secretário do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral). A gente via os alunos que estavam mais adiantados e montávamos outras classes. Foi nessa época que tive vontade de me aprofundar nos conhecimentos de gramática. Eu ia até as escola, conhecia o material e conversava com os alunos. Tive vontade de chegar em casa e me aprofundar no assunto. E vi que eles tinham razão: ninguém consegue aprender tudo na língua portuguesa, no entanto, nós ficamos lutando sem poder reformar em um ponto que atinja a necessidade do povo. Eu não cheguei a cursar Letras porque ocorreram dois problemas de ordem familiar quando eu fui fazer o vestibular. Achei que não deveria mesmo fazer.
JC - Foi também nessa época que sua história com a literatura teve início?
José Perea - Na verdade foi bem antes. Eu fiz um trabalho na escola quando fazia o ginásio no Liceu. O professor deu um trabalho para fazermos sobre a palavra “que”. Meus colegas chegaram com trabalhos de três ou quatro páginas e eu cheguei com o meu de 35 páginas. O professor deu risada e falou que meu trabalho merecia se tornar um livro. Fiquei entusiasmado, procurei um livreiro em São Paulo, e foi publicado. Naquela ocasião, todo mundo estudava gramática. E minha obra foi um sucesso. A Editora Tecnoprint – Edições de Ouro, livretos de bolso, comprou os direitos. Com o dinheiro dei entrada em uma casa. Parei de escrever porque estava entrando na prefeitura e tinha muito trabalho. Mas, quando me aposentei, tentei escrever alguma coisa de literatura mesmo: o “Ano 2026”.
JC - Quando o senhor passou a integrar a Academia Bauruense de Letras?
José Perea - Foi em 2006, quando o então presidente Munir Zalaf me convidou. Eu tenho colaborado na medida do possível. Quando começou a onda da entrada em vigor do novo acordo, eu corri e propus ao Munir uma cartilha, e depois um livro. Passamos a vender em São Paulo e em outros Estados.
JC - E sobre a Alfabeto Sem Amarras?
José Perea - Sou presidente da ONG. O nosso objetivo é estudar e divulgar a necessidade de se fazer uma ampla reforma ortográfica em nossa língua. Há mais de duas décadas, divulgamos nossa tese. Temos esse trabalho divulgado, não só no Brasil, como nos demais países lusófonos, no site: www.alfabetosemamarras.org. Apontamos as incongruências ortográficas de nossa língua e procuramos dar uma conotação moderna sob o ponto de vista gramatical.
JC - O senhor já tem um próximo trabalho encaminhado?
José Perea - Sim, na Antologia 2015 da Academia Bauruense de Letras escrevo um tipo de autobiografia em forma de entrevista: “A Entrevista que não dei”. A antologia é uma obra aberta a todos os que querem participar, com os mais diversos tipos de textos.
JC - O que trouxe o menino José Perea a Bauru?
José Perea - Eu nasci em Presidente Alves e vim para Bauru aos 8 anos de idade, porque meu pai era motorista de praça. Casei-me aos 27 anos de idade. Naquela época, a gente gostava muito de dança de salão (risos), por isso não me casei tão novinho assim.
JC - E o senhor era um bom dançarino?
José Perea – (risos) Até que era, sim. Mas eu conheci minha esposa no Liceu Noroeste. Eu dirigia um jornal, o “Bauru Estudantil”, e escrevi uma crítica sobre um professor de gramática. Ela foi aluna daquele professor e quis saber quem era aquela pessoa que escreveu a crítica. Chegou toda brava e aquela briga terminou em casamento (risos). Tivemos dois filhos e quatro netos e vivemos juntos durante quase 60 anos, até o seu recente falecimento. Quando jovem, eu também nadava muito e ganhava muitas medalhas. Agora eu só brinco na água. Cheguei a ser campeão de Bauru nos Jogos Noroestinos, ganhei medalhas nos Jogos Abertos...
JC - O José Perea é um homem realizado?
José Perea - Assim eu me considero. Há um tempo eu não procuro mais ganhar dinheiro. Presto serviços para amigos e para quem quiser sobre gramática e redação. Tiro dúvidas, faço conferências, palestras... Tudo sem cobrar nada, só pelo prazer de trabalhar com o que eu gosto. Eu fiz muita coisa na prefeitura e, sem aparecer, contribuí para o progresso da cidade. Com o turismo fiz as viagens mais diferentes possíveis para a América do Sul. E as pessoas gostavam, agradeciam pelo cuidado que eu tinha com as excursões. Também tive momentos muito difíceis. Perdi minha senhora recentemente e, em 2013, sofri um acidente de carro com amigos, onde um colega faleceu, infelizmente. Eu estou tomando remédios até hoje. Agora, os outros atropelos que a vida me apresentou, eu acho que tirei de letra.